ECOS DA ETERNIDADE
texto V
Não é de se admirar
que os inimigos conspirem contra nós, mas às vezes aqueles que comem conosco
podem se tornar perigosas iscas na rede do Maligno e nos causar danos. Jesus
sofreu isso na pele e com José do Egito não foi diferente, mas uma coisa é
certa, não se ofusca
Uma estrela
que nasceu pra brilhar
“Todos nós temos sonhos,
mas aqui quero me reportar àqueles que o Todo-Poderoso sonhou para nós usando caminhos
que nos parecem atalhos, mas que foram muito bem traçados por Ele.
Vivíamos em Canaã com o nosso velho pai; nosso irmão José estava no auge dos
seus dezessete anos de idade, na verdade, naquela época todos éramos jovens e
somente após constituir família e ter filhos, pude entender o amor do papai por
José, certamente não era maior que o que sentia por nós, era apenas diferente...
O que havia
era uma afinidade muito forte entre eles, afinal, meu irmão era obediente, era filho
da sua velhice, foi por sua mãe que trabalhou incansavelmente para o nosso avô
e, além disso, denunciava nossos erros; isso nos importunava porque não
entendíamos que a verdade, apesar de doer, precisa ser dita, e como éramos mais
velhos que José, não admitíamos ser censurados e corrigidos por ele... tudo
isso contribuía para uma aproximação maior entre ele e o papai.
Acontece
que nós, cegados pela inconveniência, já não suportávamos o chamego dos dois, pois
até presentinho papai fazia pra ele, com
isso, começamos a hostilizá-lo e a tramar algo contra ele.
Passados alguns dias, o rapazote começou a ter uns sonhos estranhos que
acendeu ainda mais a nossa ira: no primeiro, o molho dele se levantava e ficava
de pé no campo e os nossos o rodeavam e se inclinavam diante do dele; no outro
sonho, eis que o sol, a lua e onze estrelas se inclinavam diante dele. Até nosso
pai, que tanto o prezava, repreendeu-o por tamanha afronta... onde já se viu
nossos pais e todos nós nos curvarmos diante de um meninote petulante que se
fazia sonhador! E cada vez mais nossa cegueira nos fazia invejá-lo e odiá-lo
como a um inimigo.
Um dia, fomos apascentar as ovelhas, nosso pai pediu a José pra ver se o
rebanho e nós estávamos bem, porém nossa mente cauterizada e doentia nos fazia
pensar que havia ido nos espionar e pra nós, espiões merecem a morte.
Quando descansávamos, avistamos José de longe e antes que chegasse perto, conspiramos matar o sonhador-mor e nos livrar desse estorvo em nossas
vidas; nosso irmão mais velho foi mais sensato e implorou que não tirássemos sua
vida porque certamente o seu sangue recairia sobre nós; então, o lançamos numa cova
no deserto, pegamos a túnica de várias cores que papai havia dado pra ele e
ficamos remoendo o que fazer para ‘dar cabo dele’.
Enquanto isso, surge uma caravana de ismaelitas vindo de Gileade para o Egito
e tive a ideia de vendê-lo, assim nos livrávamos dele, receberíamos uma boa
recompensa e não seríamos responsável pelo seu sangue. Nessa hora, Rúben veio
chegando e ao ver que José já não estava mais na cova, rasgou
suas vestes e se revoltou contra nós; contei-lhe o ocorrido, matamos um cabrito,
tingimos a túnica de sangue para explicar a situação pra nosso pai e assim
seguimos pra casa.
Vocês devem imaginar a dor do nosso velho pai ao receber a notícia! mas a ira
que jazia em nós era tanta que mesmo sendo tementes a ele e a Deus vibrávamos com
a história que inventamos para nos livrar de um inocente.
Papai passou dias vestido de pano de saco se lamentando e ainda que nós,
seus algozes, tivéssemos a ousadia de consolá-lo depois de tudo que fizemos,
ele afirmou que seu choro desceria com ele à sepultura...
Depois disso, não soubemos mais nada de José até irmos para o Egito atrás
de comida, pois a terra morria de fome e somente lá havia provisão. Nesse
tempo, José governava o Egito e se fez grande entre eles, mas não sabíamos; já
havia se passado muito tempo e quando o vimos, não o conhecemos, pois estava
bem diferente, inclusive parecia mesmo um egípcio.
José nos reconheceu logo, mas nos tratou como a estranhos, ele era muito astuto e sábio e iria se revelar na hora certa; afirmou que éramos espias
pra que voltássemos com Benjamim, seu irmão que ficou com papai, e ele pudesse nos contar toda a sua saga depois que o vendemos como uma mercadoria.
Para provar que éramos pessoas de bem, um de nós deveria ficar preso
e trazer o caçula, comprovando nossa versão... enquanto isso, sentíamos o peso de
termos feito mal a nosso irmão; Rúben estava irado conosco e nos acusava de não
tê-lo ouvido e agora o sangue de José estava sobre nós. Simeão foi amarrado e preso
e assim ficaria até que voltássemos.
Chegando em casa, contamos tudo a nosso pai e explicamos que deveríamos
retornar lá com Benjamim, como papai se recusava em deixá-lo, Rúben até sugeriu
que poderiam matar seus dois filhos se não tornasse a trazer o caçula são e
salvo, mas não estava havendo acordo com o papai.
A fome continuava assolando a terra e quando acabou o mantimento, tivemos
que retornar ao Egito; aí, novamente brigamos com o papai que relutava pra não deixar
Benjamim partir conosco, mas fui incisivo me oferecendo como fiador dele se algo acontecesse, assim seria réu de crime para com meu pai para sempre... depois de muita conversa partimos.
Nosso pai preparou o mais precioso da terra como presente ao governador:
bálsamo, mel, especiarias, mirra, terebinto e amêndoas, e levamos dinheiro
dobrado pra pagar o que comprássemos e devolver o que haviam nos dado por
engano no Egito.
Ao nos rever, quase José se revela, mas antes que isso acontecesse, fez nos
levarem até sua casa, contamos o que havia acontecido com o dinheiro, por isso o trouxemos
pra devolver, mas ao invés de nos prender, ele nos ofereceu um jantar e só não se
assentou à mesa conosco porque é abominação pra os egípcios comer com judeus.
Depois disso, partimos novamente tranquilos porque tudo havia dado
certo; Simeão estava livre e Benjamim a salvo, entretanto, José pediu pra colocarem
seu copo de prata na boca do saco do caçula e quando estávamos a uma pequena distância
da sua casa, seus soldados nos alcançaram e nos levaram cativos de volta
dizendo que éramos ladrões.
Ficamos indignados e dissemos que aquele com quem fosse achado o roubo
que morresse e os demais se tornariam escravos do governador, mas os soldados falaram
que a lei pune apenas o infrator, os demais estariam livres.
Ao procurarem o copo, acharam-no no saco de Benjamim, então rasgamos
nossas vestes e retornamos para implorar clemência ao governador; prostramo-nos
diante dele e fomos duramente repreendidos por ele. Ainda argumentei que todos
estaríamos dispostos a pagar pelo mal feito, mas ele só queria a Benjamim, o autor do roubo.
Nesse momento, fui tomado por uma força e um amor que nunca havia
sentido, roguei compaixão da parte dele, contei-lhe todo o sofrimento do nosso
pai pela perda de José e o quanto sofreria sem o caçula; expliquei-lhe a importância
desse moço à sua velhice e como me fiz fiador dele; por fim, justifiquei que não
me perdoaria se fosse culpado pela amargura do meu velho pai e propus ficar no lugar
de Benjamim para não ver o mal que sobreviria a meu pai se ele não voltasse
conosco.
Foi então que José, mandando sair de sua presença todos os egípcios, levantou
sua voz em choro e confessou quem era. Mal pudemos acreditar, nosso irmão agora
era governador do Egito e não nos imputou o pecado de o termos vendido porque
sabia que tudo foi feito para que a glória de Deus se manifestasse, para
conservação da vida do Seu povo e para nos ensinar grandes lições.
Os sonhos se concretizaram e agora eram claros pra nós....
Tudo isso me fez entender muita coisa; meu coração se redimiu e se
arrependeu das maldades que fizemos em nome de um ódio sem sentido e desmedido; depois de tudo, minha alma sentia o peso dos erros, mas experimentava o anelo do perdão.
Habitamos com nosso velho pai na terra de Gósen presenteada por Faraó e ficamos
perto de José todos os anos de nossas vidas; e conforme Deus havia sonhado pra nossa família e pra José, a fome não foi sentida por nós, pois Ele nos guardou e orientou
tudo perfeitamente.
A estrela que o Todo-Poderoso faz brilhar ninguém jamais apagará”.