Na postagem anterior, dediquei um poema da nossa Antologia Eco Poético pra vocês. Segue um artigo para reflexão sobre o preconceito que temos em relação à língua e como nos enganamos em acreditar que ensino da língua é igual a ensinar gramática (ver ANTUNES, BAGNO, POSSENTI, etc.).
Preconceito linguístico
um pecado (da) capital
Oi, pessoal...
Trouxe mais uma questão sobre a língua portuguesa pra nós avaliarmos.
Vocês acreditam que o preconceito mais latente em nossa
sociedade não é mais o racial?! Também não tem nada a ver com homofobia... Na
era do bullying, o preconceito que se prolifera nas grandes cidades é o
linguístico.
Um grupo muito grande de curiosos da língua (e outros
tantos profissionais das diversas áreas que não sei por que “metem o nariz onde
não são chamados”) se acha “dono da língua” (e da verdade); acredita em um
falar certo e em um errado, além de usar outros adjetivos pejorativos aos que
considera erro: língua tosca, feia, de jeca...
Um absurdo!
Pessoas de todas as classes admitem que um falante nativo
(no caso do português) fale “errado” sua própria língua.
Como isso é possível?
Gostaria de ser esclarecida acerca do assunto, preciso
que me expliquem sobre esse fenômeno, afinal estudei anos, fiz
diversas pesquisas nessa área de atuação e não “esbarrei” em nenhuma “língua
portuguesa errada”.
Precisamos entender que a língua EVOLUI (nunca regride ou
degenera como dizem alguns desinformados preconceituosos) e com a evolução vêm
as mudanças (geralmente a longo prazo). O que era ontem ecclesia passou a ser igreja; plaga > praga; sclavu
> escravo[1].
Como podemos discriminar quem diga “frauta”, “pranta”,
“ingrês” se por meio desse fenômeno a língua portuguesa evoluiu?
E se a história não os convenceu, pensem em um dos
mais famosos escritores portugueses, considerado artista ímpar na arte de
escrever, o poeta Luis de Camões, a quem até hoje os portugueses prestam sua
reverência pela escrita “correta”.
Camões, em sua imortal obra “Os Lusíadas” utilizou as
mesmas palavras que acabamos de citar:
“E não de agreste avena, ou FRAUTA ruda” (canto I, verso 5)
“Era este INGRÊS potente, e militara” (canto
VI, verso 47)
“Nas ilhas de Maldiva nasce a PRANTA” (canto
X, verso 136)
Isso é somente uma parte do que podemos perceber de
evolução, exemplos que os ignorantes no assunto não tomam para explicar a
língua que vive em função de seus usuários; são os falantes que determinam o
que é “normal”, o que é norma... não um livro arcaico ou uma espécie de bíblia
linguística que os “dinossauros” da linguagem carregam embaixo do braço e fazem
dela um livro de cabeceira.
A dinamicidade da língua é algo fabuloso e já é tempo de
abrirmos a mente e entendermos o processo da linguagem antes de sairmos por aí
tachando de certo e errado aquilo do qual não temos conhecimento.
E tenho dito!
DICA DE LEITURA:
BAGNO,
Marcos. Preconceito Linguístico - o
que é, como se faz. 32. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2004.